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© Herberto Smith |
antero_Abraçámo-nos como só os homens que se conhecem se sabem abraçar. Em reconhecimento atraímos todos os que passavam na rua àquela hora, poucos eram, mas nenhum recusou o abraço, o aperto de mão, a pancadinha nas costas, o calduço no puto que neste caso era eu, ou mesmo o beliscão que dois ou três pediram em si próprios para cumprir a prova definitiva da realidade. O Salvador tinha regressado e estava um homem, Estás um homem pá, Cresceste, Nem pareces tu, Ó Antero eu não te disse que ele voltava. Tantas perguntas. Tantas daquela curiosidade que só os que muito passaram sabem passar, tantas e tão pouco tempo para as responder a todas. Queria responder a todos de maneira que os fizesse sentir bem. Muitos deles conheciam-me do tempo em que dei os primeiros passos, em que dei as primeiras quedas de bicicleta, em que sem saber me meti em grandes sarilhos com o merceiro da esquina ou com a Dona Virginia da Padaria. Carcaças com doce de tomate precisam de pelo menos uma carcaça e um quilo de tomates com um quilo de açúcar numa panela. A panela só a pedi emprestada e ninguém leva a mal as carolices dos putos e todos daqueles homens, agora maduros, todos sem excepção foram pequenos ladrões de pequenos tesouros que apesar de baratos em todas as épocas são mais valiosos quando subtraídos, numa aventura, ao seus verdadeiros proprietários. Assim estávamos entre abraços e amaços quando o Antero interrompeu. Nada tinha dito depois da primeira frase ao avistar-me, Deixem-me um pedaço do Rei para mim. Ninguém contrariava o Antero desde que foi o primeiro a habitar ali em 49, todos o sabiam sábio e patriarca do bairro. Apesar de ser na cidade aquilo ali era uma aldeia. No silêncio com tosses de velhotes, o Antero por baixo dos seus olhos azuis a 1 metro e 90 centímetros do chão ordenou: Vamos almoçar, pago eu.
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